sábado, 28 de maio de 2011

A importância de regularizar a União Estável


por Mirian Veloso M. de Andrade

Cada vez mais se debate sobre a dinâmica dos relacionamentos contemporâneos, que inclui tipos de conjugalidade muitas vezes efêmeras, precárias ou permeadas por interesses egoísticos. 
Segundo estudos orientados pela Doutora Terezinha Féres-Carneiro, da Universidade Católica do Rio de Janeiro, a sociedade vive uma era de mensagens e fenômenos confusos, fluídos e imprevisíveis. Um dos autores por ela citados - Bauman - denomina o tempo presente como “modernidade líquida”, equiparando-o ao mundo darwiniano, onde o melhor e mais forte sobrevive. Nesse quadro, o relacionamento humano se configura como efêmero.(1)
Adicionalmente, talvez até em síntese, poderia se afirmar a ausência de compromisso e de alteridade em tais relacionamentos. De fato, apontam os referidos estudos que os sentimentos e relacionamentos são vistos e vividos como descartáveis, paradoxalmente como justificativa da busca de segurança: a fragilidade do laço e o sentimento de insegurança inspiram um conflitante desejo de tornar o laço intenso e, ao mesmo tempo, deixá-lo desprendido.(2)
Por outro viés, no que impacta o Direito, a sociedade tem relativizado a importância institucional do casamento. Segundo a pesquisadora, Giddens afirma que o compromisso e a história compartilhada deveriam proporcionar aos parceiros algum tipo de garantia de que a relação será mantida por um período indefinido. Mas a isso ele contrapõe o contexto social contemporâneo, postulando que o casamento não é mais considerado como uma “condição natural” e que a relação é durável enquanto houver satisfação suficiente, podendo ser encerrada a qualquer momento por um dos parceiros, fenômeno que ele denomina como “relacionamento puro”.(3)
Na prática, fatores como independência financeira da mulher, luta pela igualdade de gêneros, redução do número de filhos, aceitação do divórcio pela sociedade, entre outros, podem justificar a fragilidade dos relacionamentos.
Enquanto Bauman denomina “amor líquido” à fugacidade do amor contemporâneo, Giddens a chama de “amor confluente”, que se caracteriza pela finitude do laço no momento em que este deixa de ser vantajoso para um dos parceiros e que presume igualdade na doação e no recebimento emocional.(4)
Nesse cenário, os casais casam, descasam, (re)casam ou apenas vivem juntos sem formalidades. Às vezes, até moram em casas separadas, em situação  de concubinato, seja em sua forma dita “impura” - quando há impedimento para o casamento entre os amantes -, seja na “pura” - que equivale à figura jurídica da “união estável” -, o que comumente gera disputas nos tribunais, com o término do relacionamento, para manter ou resgatar direitos ou benefícios individuais. 
Disso se conclui que, apesar de considerada uma conquista, essa liberdade de escolha da forma de se relacionar, as pessoas estão atentas à garantia de seus direitos. Se isso for assegurado antes da ocorrência de eventos rescisórios da relação amorosa, certo que evitaria intermináveis litígios judiciais.
Daí a necessidade de formalizar a união estável, se a opção não for pelo casamento, fazendo-o por meio de um contrato particular firmado entre os companheiros, escolhendo inclusive o tipo de regime de bens que desejam observar. A união estável também poderá ser regularizada por meio de escritura pública lavrada em cartório ou em ação judicial com o fito de demarcar o tempo em que ela se iniciou e suas bases de existência, com a devida orientação jurídica. 
As pessoas já estão cada vez mais conscientes sobre a importância de se fazer essa regularização, definindo quais bens poderão ser futuramente partilhados, na ocorrência de situações como separação ou falecimento de um dos conviventes, além de elencar as demais obrigações das partes e os direitos conexos decorrentes da relação, como a obrigação de assistência moral e material recíproca, prevista no inciso II do art. 2º da Lei 9.278, de 1996, que regularizou o § 3º do art. 226 da Constituição Federal de 1988.
Esse parágrafo da Constituição, concatenado com o caput do seu artigo 226, contempla a proteção jurídica do Estado em relação à família, como base da sociedade. A lei citada, por seu turno, veio a instrumentalizar o dispositivo constitucional, reconhecendo a união estável como entidade familiar e prevendo os direitos decorrentes dessa situação fática, agora com contornos jurídicos, nos termos do princípio da proteção estatal.
Aproveitando o tema, oportuno fazer referência ao recente julgado do Supremo Tribunal Federal, de 5 de maio de 2011, no qual o eminente Ministro Relator Ayres Britto acolheu em seu voto, como entidade familiar, as uniões estáveis de relacionamento homoafetivo. Trata-se evidentemente de uma decisão histórica, uma vez que essa minoria vinha sendo alijada da proteção jurídica de seus direitos civis. 
Entendo que a Lei 9.278, de 1996, passará a ser aplicada analogicamente também às uniões homoafetivas, sendo assim consagrada pela jurisprudência até que o Poder Legislativo venha a regular de vez a moldura jurídica dessas situações de fato.  
Por outro lado, vejo a necessidade de fazer aqui uma ressalva quanto à conversão da união estável em casamento, vez que tem se feito confusões acerca das consequencias da referida decisão, por exemplo, em relação ao casamento religioso. Alguns setores conservadores e ligados à Igreja estão temerosos de que, a partir de agora, as igrejas ou templos deverão fazer casamentos de uniões homoafetivas. De maneira alguma. O STF reconheceu que os direitos civis que se aplicam a uniões heterossexuais se estendem aos casais homoafetivos, porém, isso não interfere nos estatutos internos, crenças e práticas de cada igreja. Cada uma dessas associações possui autonomia de organização assegurada no Código Civil, tendo, portanto, suas próprias regras, às quais o cidadão que deseja ali participar é que deverá a elas se adequar.
Nesse passo, é de se prever que progressivamente serão assegurados a essa minoria direitos de herança, de incluir dependente em plano de saúde, de assistência material a título de alimentos ao convivente que necessitar, e alguns direitos previdenciários estipulados em cada caso, na forma da lei.
Por fim, ainda no que tange às decorrências daquela recente decisão da Corte Constitucional brasileira, toma ainda maior vulto a pergunta sobre se podem os casais homoafetivos adotar. A decisão, em verdade, não cuidou de tal assunto especificamente; por outro lado, se os mesmos direitos dos casais heterossexuais vierem a ser estendidos aos homoafetivos, é de se esperar que possam regularmente adotar ou ter a guarda de criança ou adolescente. Já é sabido que os tribunais vêm reconhecendo essa possibilidade caso a caso; agora, se tornou mais fácil para o juiz proferir uma decisão favorável a essa pretensão, aplicando, por analogia, o julgado do Supremo Tribunal Federal.
__________
(1)Conjugalidades contemporâneas : um estudo sobre os múltiplos arranjos conjugais da atualidade. Disponível em: <http://www.fundamentalpsychopathology.org/pesquisas/pesq_feres-carneiro.pdf>. Extraído em: 23/5/2011.
(2) Idem, ibidem.
(3) Idem, ibidem.
(4) Idem, ibidem.

terça-feira, 3 de maio de 2011

Adoção, Guarda e Princípios Constitucionais pertinentes: retrospectiva de publicações no blog Direito com Arte

Cada vez mais se impõe a necessidade de tornar realidade aquilo que determina (promete? se compromete?) a nossa Constituição, em seu artigo 227: "É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão." Vamos arregaçar as mangas, dar as mãos e batalhar para que essa prioridade se realize! 


Domingo, 28 de Março de 2010
STJ determina a retirada de criança de abrigo e sua devolução a casal que detém sua guarda provisória
A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que um bebê seja retirado do abrigo de menores de Cachoeira Paulista (SP) e devolvido ao casal que detém sua guarda provisória, até o julgamento das ações pelo […]  Clique abaixo para seguir o link com o texto completo: Princípios do interesse superior da criança, da solidariedade, da dignidade humana, da busca da felicidade
Terça, 23 de Março de 2010
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a devolução da guarda de uma criança aos pais adotivos que não estavam inscritos no Cadastro Nacional de Adoção. Para os ministros, a observância do cadastro de adotantes, com a preferência para as pessoas cronologicamente inscritas, não é absoluta. Tem prevalência o melhor interesse do […] Clique abaixo para seguir o link com o texto completo: STJ devolve guarda de criança a casal não inscrito no Cadastro Nacional de Adoção
por Mirian Veloso M. de Andrade
Segunda, 30 de Novembro de 2009
Este é o primeiro de uma série de comentários sobre as alterações recentemente introduzidas em relação ao instituto da adoção, no Brasil. Temos por objetivo ampliar o debate, com vistas a que sejam identificados os aperfeiçoamentos e correções necessários aos textos legais, assim […]  Clique abaixo para seguir o link com o texto completo: Nova Lei de Adoção: avanços e retrocessos – mais utopia que realidade (I)
Segunda, 20 de Julho de 2009
Em se tratando de adoção à brasileira (em que se assume paternidade sem o devido processo legal), a melhor solução consiste em só permitir que o pai adotante busque a nulidade do registro de nascimento quando ainda não tiver sido constituído o vínculo de socioafetividade com o adotado. A decisão é da Terceira Turma do […] Clique abaixo para seguir o link com o texto completo: Adoção à brasileira não pode ser desconstituída após vínculo de socioafetividade
por Adriana Bernardes, do Correio Braziliense 
Terça, 2 de Junho de 2009:
Em três anos, o número de candidatos aptos a acolher uma criança na capital teve aumento considerável. Há histórias de quem já adotou e quer repetir a dose e de quem sonha com o primeiro filho. Nos últimos três anos, o número de famílias habilitadas para acolher uma criança ou adolescente aumentou 400% no Distrito […] Clique abaixo para seguir o link com o texto completo: Adoção - Interesse cresceu 400% no DF
















segunda-feira, 2 de maio de 2011

Nomeação em concurso público: direito subjetivo efetivamente adquirido pelo aprovado dentro do número de vagas


Importante decisão foi divulgada em 2 de maio de 2011, pela Coordenadoria de Editoria e Imprensa do Superior Tribunal de Justiça (STJ), a saber, o acórdão firmado pela Segunda Turma nos autos do Recurso Especial nº 1232930/AM (Registro nº 2011/0011541-9), relator o Ministro Mauro Campell Marques. (*) 
O julgado, ao negar recurso do Estado do Amazonas, vem mais uma vez confirmar que "É ilegal o ato omissivo da Administração que não assegura a nomeação de candidato aprovado e classificado até o limite de vagas previstas no edital".
Conforme a notícia, "O estado recorreu ao STJ após o Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM) decidir que, tendo sido os candidatos aprovados dentro do número de vagas, é indiscutível o direito subjetivo às nomeações e posses. No recurso, o estado do Amazonas sustentou tanto a impossibilidade jurídica do pedido e do Poder Judiciário adentrar no mérito do ato administrativo. Alegou, ainda, a ocorrência da mudança do entendimento jurisprudencial acerca da aprovação em concurso público".
Segundo a nota, "Ao decidir, o relator, ministro Mauro Campbell, destacou que o candidato aprovado dentro do número de vagas tem direito adquirido à nomeação. Segundo ele, a jurisprudência do STJ é no sentido de que, quando a Administração Pública demonstra a necessidade de preenchimento de cargos no número de vagas dispostas no edital de abertura do concurso, a mera expectativa de direito dos candidatos aprovados – antes condicionada à conveniência e à oportunidade da Administração (Súmula 15 do Supremo Tribunal Federal) – dá lugar ao direito líquido e certo à nomeação dos candidatos aprovados e classificados dentro do número de vagas oferecidas"
Confira-se a ementa do acórdão disponibilizado no Diário da Justiça Eletrônico (DJe) de 28 de abril de 2011: ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. CANDIDATO APROVADO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTAS NO EDITAL. DIREITO ADQUIRIDO. 1. Aduz o recorrente a impossibilidade jurídica do pedido feito pelo recorrido, em sede de mandado de segurança, de nomeação a cargo de auxiliar operacional de saúde, em razão da inércia da Administração em promover a investidura da impetrante. 
2. O Superior Tribunal de Justiça possui precedente no sentido de ser dado ao Judiciário analisar nomeação de candidato aprovado dentro do número de vagas. 3. Da análise dos autos, verifica-se que o Tribunal a quo decidiu que a ora recorrida tem direito adquirido à nomeação, eis que foi aprovada dentro do número de vagas previsto no edital do certame. 4. A jurisprudência desta Corte Superior tem se firmado no sentido de reconhecer que, quando a Administração Pública demonstra a necessidade de preenchimento dos cargos no número de vagas dispostas no edital de abertura do concurso, a mera expectativa de direito dos candidatos aprovados - antes condicionada à conveniência e à oportunidade da Administração (Súmula n. 15 do STF) - dá lugar ao direito líquido e certo à nomeação dos candidatos aprovados e classificados dentro do número de vagas oferecidas. 5. Ademais, ressalta-se que a necessidade de prover certo número de cargos exposta no edital torna a nomeação ato administrativo vinculado, de modo que é ilegal o ato omissivo da Administração que não assegura a nomeação de candidato aprovado e classificado até o limite de vagas previstas no edital. 6. Recurso especial não provido.
Note-se uma particularidade: a Súmula nº 15 do Supremo Tribunal Federal (STF), aprovada na sessão plenária de 13 de dezembro de 1963, apontada no acórdão como superada pela Jurisprudência superveniente, não aponta, salvo melhor juízo, para a subsunção, à conveniência e oportunidade da Administração, da nomeação do candidato aprovado dentro do número de vagas abertas pelo edital do concurso. Senão, vejamos: "Dentro do prazo de validade do concurso, o candidato aprovado tem o direito à nomeação, quando o cargo for preenchido sem observância da classificação".
Quer nos parecer que a supressão de eficácia da referida súmula se deu em relação à expressão "Dentro do prazo de validade do concurso", uma vez que a Jurisprudência predominante de alguns anos para cá é no sentido de que, tendo o candidato ingressado em juízo, aqui, sim, dentro do prazo de validade do concurso, terá seu direito à nomeação assegurado, observada a ordem de classificação e caso tenha tido sucesso na demanda, sem impedimento que isso seja feito por execução provisória de sentença ou em decorrência de decisão liminar ou tutela antecipada que concedeu sua permanência no processo seletivo público ou corrigiu irregularidade ou omissão na atuação do Administrador.
Aliás, já é presente, também, o reconhecimento tanto de que há direito subjetivo à nomeação, efetivamente "adquirido", nos termos do art. 5º, XXXVI, da Constituição, para o aprovado dentro do número de vagas, como também de que o ato ilícito da Administração pode ser corrigido mesmo com impetração posterior ao prazo de validade do concurso. 
Neste sentido, o seguinte exemplar acórdão do STJ, que faz referência a outros importantes precedentes: 
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONCURSO PÚBLICO. APROVAÇÃO DENTRO DO NÚMERO DE VAGAS PREVISTO NO EDITAL. DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. MANDADO DE SEGURANÇA. (...) 3. A jurisprudência desta Corte é firme no sentido de que o candidato aprovado dentro do número de vagas previsto no edital do certame não tem mera expectativa de direito, mas verdadeiro direito subjetivo à nomeação para o cargo a que concorreu e foi classificado. Precedentes: RMS 31.611/SP, Rel. Min. Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 17/5/2010; RMS 23.331/RO, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 5/4/2010. 
4. De acordo com entendimento consolidado deste Superior Tribunal de Justiça, mesmo após expirado o prazo de validade do concurso público, há interesse processual do candidato na impetração de mandado de segurança contra ato omissivo consubstanciado na ausência de sua nomeação. Precedente: RMS 21.323/SP, Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, Sexta Turma, DJe 21/6/2010. (...) (AgRg nos EDcl no Ag 1334659/BA, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/04/2011, DJe 19/04/2011) (grifamos)
Decisões como as aqui apresentadas merecem nosso aplauso e reconhecimento de que os tribunais brasileiros estão efetivamente atuando em defesa dos direitos dos cidadãos.
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(*) "Candidato aprovado e classificado dentro das vagas previstas no edital tem direito a nomeação". Fonte: internet. Disponível em: http://www.stj.gov.br/portal_stj/publicacao/engine.wsp?tmp.area=398&tmp.texto=101635.